Passar as férias em uma cidade
praiana, aos 14 anos, é uma das coisas mais gostosas que podem acontecer na
vida de alguém. Digo isso mesmo por experiência. A prepotência da juventude, um
sentimento de imortalidade, tudo se amplifica naquelas semanas de descobertas
em um local despretensioso e simplório. São momentos inesquecíveis ou únicos
que vão ser guardados para uma vida inteira. Esse é o tempo presente de Pauline
(Amanda Langlet). Ela está permeando essas circunstancias,
aventurando-se por desgarrar-se dos pais, aproveitando ensolarados dias com a
ainda jovem e recém-divorciada prima, a bela e sensual Marion (Arielle
Dombasle). Em uma bucólica casinha de veraneio elas discutem e divagam
sobre o amor e a vida. Claro que os romances praianos não tardam. Para Pauline,
um garoto tão simpático como ela. Pelos carinhos de Marion surge uma disputa
entre um ex-namorado e um sujeito boa praça, mas cheio de manhas, que logo
colocará todos em uma ciranda de mentiras e confusões.
Bem, até por essa premissa inicial,
pode-se prever um filme sobre adolescência e ritos de passagens mais do que
tradicional. Porém, Pauline na Praia passa
longe de ser algo apenas trivial. O trato do diretor francês Eric
Rohmer é mais do que especial, mesmo em uma obra que
não foge de sua simplicidade. Rohmer,
que acumula a direção e o roteiro, é um cineasta que prima pelos belos
diálogos, contestadores, sintetizando ufanias, utopias e ainda assim busca pelo
racional, criando assim verdadeiros e emocionantes embates verbais. A partir
deles é que realiza uma obra que vai ganhado o espectador aos poucos. Aquele
filme aparentemente lento lhe toma de assalto, e quando menos percebe, está
inebriado pelo frescor de uma narrativa tradicional, mas cheia de sentimentos e
discussões bem pertinentes ao caráter humano. O trabalho de Rohmer é
pouco apegado a grandes construções plásticas, o que lhe interessa são as
representações vindas das atuações e a sua historia contada de maneira sutil,
mas que causa alguma reflexão.
Então, como uma onda daquele belo
balneário, somos levados a acompanhar o cotidiano de Pauline em suas férias.
Paralelamente também presenciamos as desventuras de sua prima Marion. Tudo isso
sem pudores excessivos. Os corpos nus dos personagens enchem o filme de
vivacidade, ainda de uma maneira tão natural que parece que sentimos exalar o
cheiro de seus sexos quando os espiamos, junto com a câmera do diretor, em seus
momentos mais íntimos. Vemos Pauline e seus 14 anos descobrirem a sexualidade,
não de uma maneira que afronte, mas de forma romântica e encantadora. Já com
Marion, os momentos são mais quentes e intensos, mas não menos merecedores da
nossa inveja e que mesmo invejosos, ainda felizes ficamos por assim
contempla-los. Propositalmente, Rohmer traça
um comparativo entre os romances das moças. Como tudo uma hora pode ser tão
franco e de repente de uma complexidade insolúvel. É a visão de uma jovem
“inexperiente” contrastando com a de uma mulher que sofreu em um casamento
claustrofóbico, mas que mesmo assim não deixa de sonhar com um amor “que lhe
faça pegar fogo”.
Interessante que o olhar que Rohmer joga
sobre os flertes e namoros, inicialmente, podem parecer implausíveis. Como uma
menina como Pauline poderia ter tantas considerações sensatas? E como Marion,
um “mulherão” daqueles, vivida e sedutora, com toda pinta de dominadora,
poderia ser tão ingênua? Com o decorrer do filme, percebemos que as digressões
não são absurdas, tem e muito seus fundamentos. Envelhecer é inevitável, mas
amadurecimento emocional não está condicionado a idade. Fato. Pauline
na Praia é uma obra cativante,
transcende seus 90 minutos de apreciação e imediatamente cresce na memória
afetiva do espectador. Ledo engano de quem julga (como eu fazia) o diretor Eric
Rohmer como um intelectualizado e difícil, que realiza
filmes para um público extremamente culto. Rohmer é
um diretor da vida. Faz obras para quem está assistindo se ver nelas. Faz-nos
desejar seus protagonistas e viver com eles as suas histórias, mesmo que para
isso tenhamos que sofrer ou até sermos enganados. Amar é assim e a existência é
um caminho tortuoso, de bons e maus momentos. Felizmente, todos temos e vivemos
os nossos.
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