Resenha de Filme: A Datilógrafa (Populaire)

6 de junho de 2013 0 Comente Aqui!

As aventuras da dócil e atrapalhada aspirante a secretária, Rose Pamphyle (Déborah François), seu envolvimento conturbado com seu chefe, o ex-combatente Louis (Romain Duris), e o treinamento em busca de ser a datilógrafa mais veloz da Europa, quiça do mundo, servem como um bem-vindo recorte para o diretor francês Régis Roinsard digredir sobre o feminismo em voga no final dos anos 50. Ambientado em uma Paris ainda vivendo os sintomas do término da segunda guerra, descreve através dessa carismática protagonista certos anseios pertinentes as mulheres da época, que cogitavam seu papel em uma sociedade deveras machista, mas combalida pelas mazelas do conflito em solo europeu, e a consequente busca pela independência pessoal. Ainda que tal almejada auto-suficiência revele dissabores. Apesar de ser um apanhado que mira a comédia romântica, de contornos leves, A Datilógrafa não deixa de se fazer pontual em sua abordagem. Não é tão profundo quanto poderia ser, as vezes a trama parece se alongar mais do que deveria, mas é suficientemente divertido ao ponto de cativar o espectador em sua narrativa movimentada.

Curiosamente, essa última afirmação do paragrafo anterior ajuda a corroborar o que citei em outros textos sobre os recentes filmes franceses: a aproximação cada vez mais evidente com o cinema norte-americano. Longos diálogos, enquadramentos contemplativos, característica do cinema francês de outrora, também não encontram lugar em A Datilógrafa, assim como o naturalismo e realismo defendidos pela virtuosa nouvelle vague. A edição veloz, aos moldes das comédias e romances ianques, impulsiona com força a obra de Régis Roinsard. Na verdade, aqui existe certa diferença das demais realizações comerciais do país: o trabalho reverencia diretamente o cinema clássico hollywoodiano. Por vezes, as discussões do casal de protagonistas remete as comédias estilo "screwball" do final dos anos 40 e meados dos 50. Além da personagem de Déborah François admirar atrizes como Marylin MonroeKatherine Hepburn e Audrey Hepburn, ambas estrelas das constelações dos estúdios de Hollywood. Antes de ir além, importante ressaltar que tal globalização de nenhuma forma deprecia o cinema francófilo. Apenas reforça o certo estranhamento em ver um produção que prezava por sua identidade criativa se render a concessões formulaicas.

Em A Datilógrafa, Rose Pamphyle é uma jovem interiorana que ajuda o pai no bucólico armazém da família. O pai tem planos para ela: casa-lá com um bom partido local. Mas sonhadora, ela tem seus próprios desejos, tão comuns as moças da sua idade: ir para a Paris e viver a modernidade. O que em suma, é resumido em trabalhar como secretária, a profissão da moda, almejada por cinco em cada cinco mulheres "moderninhas". Para viver sua utopia, saí de casa brigada para ir em uma entrevista na capital. De imediato, impressiona o corretor de seguros Louis, principalmente por sua velocidade - desajeitada - ao manusear uma máquina de escrever. Logo ela convence o homem a dispor de uma semana de experiência no escritório. Se no ofício da datilografia Rose se resolve fácil, apesar de incomodar o patrão com sua digitação bruta, como secretária a moça é praticamente um desastre. Destruir documentos importantes é sua especialidade. Em uma de suas trapalhadas, Louis se aborrece, mas lança um desafio para que ela possa continuar no emprego: participar de um campeonato de datilografia. Rose não se sai muito bem,  lhe falta técnica, mas Louis não desiste, pois vê nela um talento natural e se predispõe a treina-lá com afinco para competições futuras. 

Para atingir suas intenções em fazer de Rose uma campeã, Louis instala clandestinamente a mocinha em sua casa e impõe um treinamento árduo visando os campeonatos locais e futuramente nacionais. Nesse meio tempo, entre a dificuldade em aprender as técnicas e lidar com as novas condições, a convivência diária faz crescer uma fascinação mútua, ainda que Louis seja reticente em se envolver amorosamente. A priori suas reservas quanto a romances surge pela decepção que passou com seu amor de infância, interpretada pela encantadora Bérénice Bejo (O Artista), esposa de seu melhor amigo, o americano Bob (Shaun Benson). Enquanto a trama de A Datilógrafa se pauta na agradável aproximação, descobertas enternecedoras, treinamentos exaustivos e conflitos amparados pelas personalidades conflitantes do casal,  tudo vai muito bem. Quando abre seu leque de possibilidades após a moça ganhar notoriedade pelo seu talento em datilografar mais de 500 toques por minuto, o filme tem uma queda visível de ritmo. Diria até que se torna uma especie de comercial de TV de época. Não chega a comprometer o resultado final, mas passa a sensação de um excessivo mise en scene, onde o visual colorido ganha mais atenção do que a trama. 




Ficha Técnica:
A Datilógrafa (Populaire).
Direção: Régis Roinsard.
Roteiro: Régis Roinsard, Daniel Presley, Romain Compingt.
País: França.
Ano: 2012.
Elenco: Romain Duris, Déborah François, Bérénice Bejo, Shaun Benson.

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