Cinema Detalhado: Resenha de Filme: Alvo Duplo (Bullet to the Head)

Faz mais de dez anos desde que o diretor norte-americano Walter Hill lançou seu último filme. Em 2002, o cinema de ação já não era mais o mesmo. Se antes Hill lotava salas com espectadores ávidos por action-heros maniqueístas surrando malvadões em epílogos catárticos, O Imbatível, com uma carreira pífia nos EUA, nem chegou perto dos cinemas brasileiros. Segundo pessoas próximas a esse projeto, a trama remontava a temporada que o lutador Mike Tyson (Se Beber Não Case 2, Tyson) passou na cadeia, onde enfrentou o campeão local em uma lendária luta. Contando ainda com um Wesley Snipes em declínio, o filme foi visto como um “alienígena” que estranhamente reverenciava as produções de ação politicamente incorretas que povoaram os anos oitenta. Anos depois, apesar de irregular, Os Mercenários (2010), de Sylvester Stallone, relembrou com sucesso a diversão que era acompanhar aventuras tão surreais.

Como um dos realizadores mais efetivos do final dos anos setenta e inicio dos oitenta, tendo no currículo filmes como Warriors – Selvagens da Noite e 48 Horas, o diretor Walter Hill não poderia ficar de fora dessa “retomada” impulsionada por Stallone. O seu Alvo Duplo é puro cinema-testosterona, de roteiro frágil e simplório, pontuado por frases de efeito, abusando dos clichês e das situações inverossímeis. Entretanto, abstraindo essas problemáticas que quase sempre caracterizam o gênero, pode ser visto com uma bobagem sincera com suas pretensões. Evidente objeto de diversão rápida e esquecível, mas que enquanto se está assistindo, entretém com eficiência e sem maiores contratempos. Aqui, não diferente de outros trabalhos pessoais, Walter Hill faz valer seu talento para construir narrativas perspicazes, mesclando tensão com bom-humor e se apoiando no carisma dos protagonistas.

Baseado na Graphic Novel do francês Alexis Nolent, intitulada Du Plomb Dans La Tête, a trama de Alvo Duplo percorre a investigação feita pelo inveterado matador de aluguel, Jimmy Bobo (Sylvester Stallone), e o detetive Taylor (Sung Kang de Velozes e Furiosos). A dupla é improvável, mas a “parceiragem” entre ambos é um dos motes principais. Se falha no que toca a convencer sobre as motivações dos personagens, principalmente Taylor, o roteiro de Alessandro Camon, do drama O Mensageiro (2009), aborda com sagacidade essa união do acaso. Jimmy procura saber quem foi que o contratou para o trabalho que culminou na morte de seu comparsa. Já Taylor, policial correto, se envolve no caso porque o trabalho pelo qual Jimmy foi enganado consistia em assassinar o seu ex-parceiro corrupto. Nesse panorama entra um advogado inescrupuloso, interpretado por Christian Slater, envolvido com especulação imobiliária e seu brutal capanga vivido por Jason Momoa (Conan - O Bárbaro, Game Of Thrones).

Se o ator Sylvester Stallone sempre levantou questionamentos quanto a sua capacidade interpretativa (o que particularmente discordo), á medida que Alvo Duplo desenrola se percebe o quanto é perfeito para o papel. Seu Jimmy Bobo não deixa de ser uma caricatura divertida dos personagens que o ator defendeu durante toda a carreira. À vontade, Sly é a força motriz do conflito instaurado entre Jimmy e Taylor, pautado por discussões sobre os benefícios e malefícios da modernidade e tecnologia. Tais diálogos também podem ser vistos como uma metáfora ácida sobre o cinema de ação antigo e o mais recente. Daí se justifique a escalação de um astro da ação de outrora e um ator de uma das franquias mais viáveis da atualidade. O argumento metafórico não chega a ser tão contundente como deveria, mas se faz necessário para abalizar o espaço tanto para uma quanto para outra forma de fazer o público acompanhar uma despretensiosa e escapista obra do gênero.