Resenha de Filme: Na Neblina (V Tumane)

26 de março de 2013 0 Comente Aqui!

O cineasta bielorrusso Sergei Loznitsa desde 1997 até a década anterior só havia feito documentários, longas e curtas, e não era muito conhecido num panorama mais amplo, geograficamente falando. O conhecimento, de fato, do seu cinema deu-se em 2010 quando seu primeiro longa-metragem de ficção, Minha Felicidade (Schastye Moe), foi indicado a Palme d'Or no Festival de Cannes. Aliás, se eu tivesse que escrever sobre esse filme não conseguiria sair da primeira linha. Minha Felicidade é seco, complexo, difícil, e muito mais do que aparenta - não é cinema para qualquer um. Cineasta que exige do espectador um certo cuidado e doses de atenção a mais está com seu segundo longa ficcional em cartaz.

Nesse novo longa, Sergei Loznitsa abandona o roteiro original para adaptar uma obra do escritor - também bielorrusso - Vasil' Uladzimiravich Bykaw (1924-2003), intitulada Na Neblina, escrita em 1989. Eu não li o livro, mas acredito que, por ser adaptação, Loznitsa foi obrigado a se limitar quanto ao número de camadas do filme, ao contrário das ilimitadas interpretações de Minha Felicidade. Então, estamos diante de um filme um pouco mais fácil de ser digerido, porém não menos interessante. Aqui, o diretor abarca temas de cunho mais filosóficos, entre eles os já corriqueiros existencialismo e moralidade, mas consegue ir um pouco mais além.

Não por coincidência, no ano em que homenagearam o brilhante cineasta russo Andrei Tarkovski (1932-1986), a Mostra Internacional de Cinema São Paulo de 2012 fez uma retrospectiva dos filmes de Loznitsa; mais do que pertinente, dentre outros motivos, por se aproximar, incisivamente, com o estilo tarkovskiano de fazer cinema. Revelar a trama de Na Neblina é também retirar parte da experiência do espectador. A narrativa que o diretor cria é de extremo cuidado técnico e teórico; Loznitsa retoma valores do cinema de Tarkovski e exerce com o mais vigor possível o esculpir o tempo.

Se há alguma coisa para revelar é que o protagonista Sushchenya (Vladimir Svirskiy) está numa enrascada. Estamos no período histórico da Segunda Guerra e os oficiais Burov (Vladislav Abashin) e Voytika (Sergei Kolesov) estão indo prender injustamente Sushchenya que mora numa aldeia no interior da Ucrânia. O filme começa assim e é apenas isso que posso dizer. O desenrolar da história não é senão uma simples alegoria para entendermos e mergulharmos na profundeza dos sentimentos humanos. Se a guerra é capaz até de interferir na moral de seus reféns e criar conflitos interiores de extremo grau, o roteiro nos permite imaginar o pior que esse terror pode alcançar.

Na Neblina acaba que flertando em algum sentido com o filme recém lançado nos cinemas A Fuga. Não só as semelhanças da fotografia, fria e sem esperança, mas como na exploração do campo natural. Belíssimas imagens de uma floresta são capturadas pela câmera de Loznitsa, onde passado e presente se confundem no mais perfeito ritmo e tom. Com tantos questionamentos o filme se encerra, dignamente, e a certeza de que a experiência valeu a pena se firma no ar. Aqui o atestado de um cineasta interessante a se acompanhar.


Trailer

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