Resenha de Filme: A Viagem (Cloud Atlas)

11 de janeiro de 2013 8 Comente Aqui!

Divagando por temáticas como livre arbítrio, esperança, destino e, principalmente, amor, essa é A Viagem, a obra cinematográfica mais recente dos irmãos Andy e Lana Wachowski, em parceria com o diretor alemão Tom Tykwer, e baseada na novela literária do escritor inglês David Mitchell. Como a composição ficcional Cloud Atlas, que intitula originalmente o filme, o trabalho dos três diretores procura ser uma imensa sinfonia de sons, imagens e sentimentos. Se por um lado, nem sempre acertam no tom, com algumas das múltiplas tramas sobressaindo mais do que outras, por outro, a montagem bem elaborada cria uma obra razoavelmente coesa, fluida e agradável de ser assistida nas suas quase três horas de execução. Assim como em Matrix (1999), obra máxima da dupla de irmãos diretores, A Viagem tem suas camadas, talvez imperceptíveis em um primeiro momento, mas lidando bem com a subjetividade, certamente renderá variadas interpretações.

A trama começa com um dos diversos personagens protagonizados por um inspirado Tom Hanks, um ancião, ensaiando contar uma história. Ainda não sabemos sua origem, nem a época em que vive, contudo, seu rosto marcado por tatuagens tribais e cicatrizes, indica um sujeito grosseiro, contrastando com sua aparente sabedoria. Ele diz: “Coelhos chiam e o vento corta os ossos. Um vento assim... Repleto de vozes... Os ancestrais gritando para nós...”. De pronto, um corte rápido nós coloca em uma cena no século XIX, logo depois, avançamos até a década de 70, para depois retroceder quarenta anos e em seguida avançar mais trezentos anos na frente, para posteriormente voltarmos ao nosso tempo atual. Parecem sub-tramas soltas, ausentes de semelhança, entretanto, não são. Apesar de separadas por décadas, séculos, se interligam e formam uma trama maior, uníssona em suas sensações e aspirações.

No século XIX, um jovem advogado, vivido por Jim Sturges, embarca em uma jornada reveladora que o levará a ver a vida por outro viés, longe do comodismo de uma vida burguesa e assim aspirar um mundo melhor. Enquanto isso, uma repórter interpretada por Halle Berry arrisca a vida em uma investigação que também pode salvar o mundo. Em outra situação, um jovem músico (Ben Wishaw) procura a sinfonia perfeita, aquela que pode transformar para sempre a vida das pessoas. No futuro distante, uma jovem automatizada (a sul-coreana Doona Bae) por uma sociedade “perfeita” tenta transgredir as normas e provar o quanto errônea é a forma como coexistem. Alguns séculos mais tarde, em uma situação apocalíptica, o ser humano luta por sua sobrevivência, já que salvar o mundo não é mais uma opção. Com apenas essas citações da ampla gama de histórias de A Viagem, pode-se notar a conexão que une espíritos e almas através de tantas eras.

A certa altura, em um momento simbólico para o filme, a jornalista de Halle Berry fala para um personagem menor: “Eu já ouvi essa música em algum lugar”. O Rapaz, cético, responde: “Não tem como, existem pouquíssimas cópias dela na América”. No entanto, ela de fato já ouviu. É a canção que rege os destinos, permeando com agrura e brandura, felicidade e tristeza, angustia e certeza os momentos da nossa existência. Nessa linha de raciocínio que segue o roteiro escrito pelos três diretores, o protagonista é a vida, que nunca morre, sendo perpetuada e transferida de ser para ser. Em uma existência você pode ser um médico assassino, em outra um escritor frustrado, em mais uma, um editor de livros estressado ou em outra, uma pessoa geneticamente programada para trabalhar em prol de uma sociedade distópica. Um escravo do futuro, assim como existiu em um passado bem distante. E mais tarde, você pode até se tornar um verdadeiro Deus.

Nessa literal “viagem” (o título nacional parece genérico, mas faz todo o sentido) que os diretores propõem ao público, eles aproveitam para passear pelos gêneros cinematográficos. Aqui, no meu ponto de vista, é onde mora o maior perigo em A Viagem. Se a ficção futurística se mostra embasada, empolgante até, apesar de alguns exageros visuais, como cenas elucidativas que remetem ao famigerado projeto anterior da dupla de irmãos, o irrelevante Speed Racer (2005), logo a vertente que toca a comédia, e a que retrata a nossa realidade, soa esvaziada, sem muitos contornos. Entretanto, é interessante perceber como os realizadores lidam de maneira natural com os clichês cinematográficos, presentes em todas as épocas, e criando uma analogia curiosa sobre os lugares comuns que habitam todos os tempos. Afinal, assim como a ficção, a vida é repleta de clichês e o maior deles, é aquele que diz que somente o amor pode curar ou salvar.

Particularmente, A Viagem me agradou, tanto nos aspectos filosóficos quanto nos de ordem técnica (montagem, trilha sonora, direção de arte). Ficam poucas ressalvas negativas para a maquiagem nem sempre eficiente, mas longe de ser comprometedora. Das citadas características técnicas, talvez a montagem do também alemão Alexander Berner - Perfume – A História de Um Assassino (2006), Resident Evil – Hospede Maldito (2002) - seja o grande trunfo da produção. Natural, alterna entre o corte-seco e o corte-continuo, criando intersecções poéticas e que funcionam totalmente a favor da narrativa. Pode-se dizer que aqui, o trabalho de Berner é fundamental para a apreciação do filme. Se no começo do parágrafo afirmei que A Viagem me foi aprazível, não duvido, até espero, que existirão discordâncias, pois como obra aberta, as conclusões acabam sendo diversas. Todavia, é louvável a maneira como os Wachowski e Tykwer ousam em trazer essa história. Pretensiosa? Talvez, mas cheia de nuances que procuram sempre edificar o verdadeiro caráter do espírito humano.




8 Comente Aqui! :

  • Lamonica disse...

    Acabei de assistir o filme. Achei cansativo, com atuacoes estranhamente ruins de atores muito bons (Tom Hanks especialmente) e, principalmente, raso. Nao ha uma cena no filme sem uma frase de efeito. Um dos filmas mais pretenciosos que ja vi, parece que quer nos convencer a cada momento que aquele é um filme profundo e "cabeca", sem chegar perto de se-lo em nenhum momento. Alem disso, nenhuma das historias é elaborada bem o bastante para que nos afeicoemos das personagens. Exceto Jim Broadbent, e o carismatico Cavandish, que talvez e a figura mais marcante do filme

  • Lucas Dutra disse...

    Achei o filme excelente! Uma verdadeira obra de arte.
    Apesar dos clássicos clichês em torno do amor, o filme foge totalmente a estrutura cinematográfica a que estamos habituados a assistir. O que muito me agrada. Gosto de me sentir surpresa e ate desafiado, de uma certa maneira, por uma obra como essa. O filme não apela para narrativas tão incompreenssíveis (como os diretores tanto utilizaram em Matrix), mas mesmo assim passa longe da simplicidade de uma narrativa barata. Os efeitos visuais, maquiagem e direção de arte são estonteantes. E apesar de nenhuma atuação significativa, o filme com certeza não vai passar despercebido pelo publico.

  • Lucas Dutra disse...

    Achei o filme excelente! Uma verdadeira obra de arte.
    Apesar dos clássicos clichês em torno do amor, o filme foge totalmente a estrutura cinematográfica a que estamos habituados a assistir. O que muito me agrada. Gosto de me sentir surpresa e ate desafiado, de uma certa maneira, por uma obra como essa. O filme não apela para narrativas tão incompreenssíveis (como os diretores tanto utilizaram em Matrix), mas mesmo assim passa longe da simplicidade de uma narrativa barata. Os efeitos visuais, maquiagem e direção de arte são estonteantes. E apesar de nenhuma atuação significativa, o filme com certeza não vai passar despercebido pelo publico.

  • Anônimo disse...

    PIOR FILME DO TOM HANKS EVERRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR.............. como eles conseguiram fazer um filme tão ruim com um elenco tão bom.Não me conformo.

  • Jefferson C. Vendrame disse...

    Que ótimo post Celo, texto perfeito, como sempre!
    Quero muito ver esse filme, ainda não chegou em minha cidade mas com certeza vai vir e já estou ansioso. Para mim Hanks é um dos melhores atores de Hollywood e dificilmente decepciona...

    Abração

 
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