Resenha de Filme: O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, 2012)

31 de janeiro de 2013 3 Comente Aqui!

É fundamental esclarecer algumas coisas sobre a obra em que este filme foi baseado para o entendermos em sua completude.

Silver Linings Playbook é, primeiramente, um livro escrito por Matthew Quick e publicado em 2008 em seu país de origem. Q (apelido), apesar de ter 39 anos, é um escritor obviamente recente, mas já tem três livros publicados e é um sucesso nos EUA. A vontade de escrever histórias começou cedo, quando Q tinha apenas 17 anos. Mas devido as circunstâncias, ele nunca conseguiu se dedicar propriamente a isso. Formou-se em Inglês e virou professor de literatura (um eterno apaixonado por poesia e romances). Por muito tempo Q discursava para seus alunos dizendo a eles que deveriam arriscar e fazer coisas incríveis sob o pretexto de que "há um potencial em todos nós", o que, inevitavelmente, somado a outros discursos amorosos à literatura, o tornou querido e respeitado.

Já sendo professor titular - o que tomava muito seu tempo - de uma universidade local em Nova Jersey, Q estava insatisfeito. Afinal, ele sempre quis escrever e contar histórias, mas nunca se dedicou de fato a isso. Em uma de suas reflexões sobre si, Q, declara em entrevistas, que se sentiu um verdadeiro hipócrita. Como ele falava para as outras pessoas arriscarem mais se ele mesmo não arriscava? Inesperadamente entrou em depressão. Nisso, resolveu largar o emprego, vendeu sua casa e se dedicou somente a escrever. A batalha foi difícil, e Q teve que morar na casa dos sogros. Escrevendo sem parar, confinado no porão sem mal sair, depois de três anos, Silver Linings Playbook foi concebido.

Na adaptação para o cinema, roteirizada e dirigida por David O. Russell (Três Reis, O Vencedor), acompanhamos Pat Solitano Jr. (Bradley Cooper), um professor substituto que tem transtorno bipolar não diagnosticado até haver um incidente entre ele e sua esposa Nikki (Brea Bee). Após o ocorrido, negocia judicialmente sua internação por oito meses em um hospital psiquiátrico. Suas últimas horas neste hospital dá início ao filme.

É sabido que David O. Russell quis fazer este filme para o seu filho, que, assim como o protagonista, também sofrera de bipolaridade. Aqui, o diretor torna o trabalho um pouco mais pessoal, dedicando uma dose a mais de carinho, e retoma características essenciais de seu filme anterior, O Vencedor (2010). Sua direção, sempre colada aos personagens, não deixa escapar um olhar dos atores. Aqui, os olhares dizem bastante.

Quando Pat retorna para casa, acompanhamos sua ressocialização na família - com seus pais (Robert De Niro e Jacki Weaver) e irmão (Shea Whigham) - e círculo de amigos. A fixação do personagem de Cooper é o que move a história: querendo reconciliar seu casamento, precisa de qualquer jeito entregar uma carta a Nikki.

É em um jantar na casa do casal de amigos, Veronica (Julia Stiles) e Ronnie (John Ortiz), que Pat conhece Tiffany Maxwell (Jennifer Lawrence), uma mulher de cabelos negros, roupas negras e unhas negras - não parecendo muito normal à primeira vista. E, de fato, um passado desagradável a impactou fortemente, tornando-a problemática. As similaridades entre os dois parecem muitas, como vemos durante o jantar, o qual se revela que eles entendem muito bem os efeitos de remédios como Rivotril e Donaren.

Tiffany é irmã de Veronica que por sua vez é amiga de Nikki. Logo, Pat pede ajuda à Tiffany para entregar a carta à "esposa", o que em troca, vai custá-lo a ser parceiro dela numa competição de dança no Hotel Benjamin Franklin. É aí que eles começam a se encontrar diariamente.

No decorrer da história encontramos Danny (Chris Tucker), amigo problemático de hospital - personagem alívio cômico desnecessário - e o terapeuta Dr. Cliff Patel (Anupam Kher) de Pat. O. Russell, por mais que queira, não se desprende de maneirismos do gênero. Porém consegue achar um equilíbrio entre o humor e o drama aceitável, acrescentado ao fato do diretor conseguir cravar no ritmo - não perdendo a mão em nenhum momento - também graças a montagem que faz miséria num filme todo picotado.

Bem como em O Vencedor (quando a mãe de Christian Bale vai buscá-lo no prédio das más influências e no carro eles cantam a música I Started A Joke), encontramos cenas memoráveis neste filme: como a discussão entre os personagens, reunidos na casa de Pat, para decidir a aposta do jogo Philadelphia Eagles vs. New York Giants e a nota da competição de dança. Aliás, a sacada com a palavra "Excelsior" é nada menos que excelente.

Um filme de atuações. Robert De Niro (Touro Indomável, Taxi Driver) volta a se destacar depois de praticamente dez anos com atuações esquecíveis, fazendo um pai supersticioso e com TOC épico - justa sua indicação ao Oscar de Ator Coadjuvante. Jacki Weaver (Picnic na Montanha Misteriosa, Reino Animal) interpretando uma mãe zelosa e super-protetora está bem no papel, mas não o suficiente para uma indicação a atriz coadjuvante no prêmio da Academia.

Já Bradley e Jennifer são um espetáculo à parte. A interação e atuação entre dois estão completamente em sintonia. É interessante como O. Russell sabe muito bem deixar os atores naturais e livres para criar e desenvolver seus personagens, o que dá uma harmonia peculiar e leveza ao filme. A atriz da franquia de Jogos Vorazes, mas também do excelente e subestimado Inverno da Alma (2010), mostra uma crescente indiscutível em sua carreira. E o ator da franquia Se Beber Não Case, tão bem quanto ou até melhor que Lawrence, surpreendentemente, mostra potencial e só aumenta o nível do longa. Ambos foram indicados merecidamente nas categorias principais de atores no Oscar.

Tocante, engraçado e com uma maravilhosa trilha sonora, O Lado Bom da Vida é um presente para Matthew Quick, pro filho de David O. Russell e para todos os degustadores de bons filmes.


Ficha técnica
Diretor: David O. Russell
Roteirista: David O. Russell
Elenco: Jennifer Lawrence, Bradley Cooper, Robert De Niro, Jacki Weaver, Shea Whigham, Chris Tucker, Anupam Kher, John Ortiz, Julia Stiles e Brea Bee
Produtores: Bruce Cohen, Donna Gigliotti, Jonathan Gordon
Distribuição: Paris Filmes

3 Comente Aqui! :

  • Anônimo disse...

    Adorei suas considerações, porém poderia ter evitado de falar demais da trama...Quem não viu o filme ainda pode considerar Spoilers. Abraços

  • Anônimo disse...

    Acredito que o filme é superestimado...David O. Russel faz um bom trabalho sim, mas não é para tanto, para um indicação ao oscar, ainda fico doente em não ver a Bigelow e o Affleck indicados...O elenco tudo bem, já que é a força do filme, todos estão incríveis...Mas o filme é bastante previsível e se torna 'bonitinho' no final....Poderiam ter arriscado mais

 
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