A novela mais famosa do escritor
russo Leo Tolstoy (1828-1910), Anna Karenina, foi adaptada para outras
mídias diversas vezes. Em 1935,
a lendária atriz de origem sueca, Greta Garbo, interpretou a personagem russa na primeira produção Hollywoodiana sobre a trágica história
de amor. Depois foi a vez de Vivien Leigh,
em 1948, defender a esposa adúltera repudiada por uma sociedade em que ferir o
matrimonio era quase um crime hediondo. Em 1967, foi à vez da própria Rússia
(então União Soviética) trazer um apanhado de Karenina com elenco local. Perto
do século XXI, mas precisamente em 1997, o cinema americano voltou à
personagem, com a atriz francesa Sophie
Marceau no papel-título. Entre tantas realizações cinematográficas que se
debruçaram sobre o texto de Tolstoy,
ainda contam uma mini-serie produzida pela TV britânica (2000) e inúmeras
incursões teatrais. Inevitável, então, surgir à pergunta: por que adaptar
novamente Anna Karenina?
Acredito que a resposta seja até
bem simples: nada como uma história de amor elaborada com nuances pertinentes
ao sentimento e viés um tanto trágico para atrair a atenção de um público ávido
por histórias emocionantes e comoventes. Se essa premissa é explorada ao
extremo em produções baratas, por que não apresenta-la a espectadores novos (e
antigos também) de maneira totalmente criativa e inusitada? Apostando nessa
ousadia de transcender certas convenções estéticas quando se fala de um épico,
é que temos Anna Karenina do talentoso diretor inglês Joe Wright, de Orgulho e
Preconceito (2005) e Desejo e
Reparação (2007). Em minha opinião, a mais eficiente adaptação
cinematográfica feita para a obra de Tolstoy.
Apoiado no roteiro do Tcheco Tom Stoppard,
que entre muitos textos, co-escreveu o do oscarizado Shakeaspeare Apaixonado (1999), o diretor conduz a história de
forma até convencional no que toca a narrativa, sem tirar nem por as principais
considerações de Tolstoy.
Se a trama segue uma linha
tradicional de evoluir os fatos, com argumentação, contra-argumentação e
desfecho climático ou e anti-climático, no meu ponto de vista, um acerto
também, a concepção visual da obra é algo deslumbrante, um trabalho de direção
de arte perfeitamente inventivo. Em tempos de produções que apostam com força
em tecnologias de ponta para angariar público, Anna Karenina vai à
contramão trazendo concepções visuais, em sua maioria artesanal, como os
imensos cenários que compõe as diversas cenas filmadas dentro de um enorme
teatro. Sim, o filme de Wright,
inicialmente, parece uma grande peça de teatro, mas com o desenrolar,
percebemos que seu trabalho transcende qualquer consideração que o englobe como
uma simples representação teatral filmada. Creio que o mais certo seria afirmar
que Anna Karenina de Joe Wright é o momento em que cinema e
teatro se fundem, criando um hibrido perfeito do melhor de cada mídia
audiovisual.
Do teatro, o diretor retira a
direção de arte peculiar, onde cenários se sobrepõem com delicadeza, contando
com a ajuda de contra-regras, que às vezes aparecem propositalmente em cena se
fazendo de figurantes. Do cinema, a produção apresenta uma fotografia
estonteante, trilha sonora soberba, que embala e marca com destreza as cenas de
maior comicidade, romantismo, sensualidade e drama. Quanto ao figurino
brilhante, essa é uma propriedade cara tanto ao cinema quanto ao teatro.
Contudo, o diretor não se limita a separar tais características, a intenção é
fundi-las, conjugando ambas de forma uníssona, onde o design de arte teatral
ganha condições altamente realísticas e logo deixam de ser algo sintético, um
mero artífice para a atuação. Nesse mise
en scene único, entram também tomadas de câmeras com vistosos
enquadramentos de encenação em profundidade e planos-sequência curtos, mas
pontuais para nos lembrar da condição cinematográfica de Anna Karenina. Essa
câmera prodigiosa passeia pelas coxias e bastidores, subindo e descendo escadas
e criando um mundo a parte dentro do próprio filme.
Com tantas condições técnicas
criadas com esmero e dedicação, o mínimo que se pode esperar são atuações
eficazes. E nesse sentido, o invejável elenco, em sua maioria britânica também,
capitaneada pela atriz Keira Knightley
e os atores Jude Law e Aaron Taylor-Johnson não decepciona em nada. Essa citada
trinca de protagonistas compõe o principal mote de Anna Karenina, onde Anna
Karenina (Knightley) é a esposa do
influente funcionário do governo, Alexei Karenin (Law), mas se envolve amorosamente com o capitão do exercito, o
Conde Vronsky (Johnson). Tudo começa
quando Anna, egressa de São Petersburgo, vai a Moscou para intervir o conflito
criado entre sua cunhada quanto ao adultério cometido pelo seu irmão fanfarrão,
interpretado por Matthew MacFadyen.
Nesse meio tempo, ela se envolve com a preparação da jovem Kitty (Alicia Vikander) que irá debutar em um
baile com o intuito de torna-se noiva do já citado Conde Vronsky. Entretanto, o
tal baile serve apenas para despertar a atração mútua entre Vronsky e Anna.
Logo, Vronsky passa a perseguir
Anna, e relutante, a mulher não se entrega tão facilmente, apesar do seu
evidente olhar de desejo. O jogo de sedução é desfiado com bastante
sensualidade, evocando desejo e libido na maioria das cenas, e tanto Keira Knightey quanto Aaron Taylor-Johnson demonstram uma
entrega grande para com seus personagens. A Anna Karenina de Keira é uma mulher forte, mas deveras
ingênua também e apegada a utopias, acredita que pode subjugar uma sociedade
hipócrita, onde o adultério masculino é aceitável, mas o feminino repudiado.
Enquanto o Vronsky de Johnson é o
típico conquistador, macho alfa, mas com certas nuances covarde e dúbio quanto
aos seus sentimentos. Karenina tem um respeito enorme por seu marido, que
apesar de provedor, não lhe entrega uma afeição romântica e sem dúvida esse é o
fator motivacional para a traição. Aqui, é importante ressaltar o trabalho de Jude Law, desprovido de charme e beleza,
entrega um Alexei educado, bondoso, mas também cruel e vingativo quando
necessário.
1 Comente Aqui! :
Creio que o mais certo seria afirmar que Anna Karenina de Joe Wright é o momento em que cinema e teatro se fundem, criando um hibrido perfeito do melhor de cada mídia audiovisual.
Sensacional e a Direção de Arte é uma das melhores que já vi.
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