Crítica: Os Infratores (Lawless)

26 de novembro de 2012 1 Comente Aqui!

O diretor australiano John Hillcoat começou a chamar atenção para o seu cinema com o western, produzido em sua terra natal, A Proposta (2005). Quatro anos mais tarde, então em solo americano, ele realizou o melancólico e desprovido de esperança, A Estrada, adaptação do respeitado romance The Road, do escritor americano Cormac McCarthy. A Estrada foi um belo cartão de visitas para Hollywood, sendo um filme aclamado pela crítica e nomeado em diversas premiações alternativas daquela temporada. Era questão de tempo até que fosse incumbido de uma superprodução, caso esse do seu novo trabalho, Os Infratores, obra baseada nas desventuras verídicas de uma família de gangsteres caipiras nos EUA da grande depressão e lei seca dos anos 30.

Em Os Infratores, o diretor John Hillcoat retoma a parceria, estabelecida em A Proposta, com o músico-compositor e roteirista Nick Cave. Aqui, o talentoso Cave adapta o romance escrito por Matt Bondurant, neto de Jack Bondurant (no filme, Shia LaBeouf), um dos integrantes da família fora da lei mais respeitada do Condado de Franklin, na interiorana Virginia. Comandada pelo violento e imponente, mas paternal, Forrest Bondurant (Tom Hardy), eles produzem clandestinamente suas bebidas alcoólicas, algo até comum e recorrente naquela comunidade. A problemática tem inicio quando os Bondurant se negam a entrar no esquema corrupto imposto pelas novas autoridades locais, assim passando a serem perseguidos com veemência pelo agente especial, oriundo da brutal Chicago, o não menos violento e afetado Charlie Rakes (Guy Pearce).

Assim como Forrest Bondurant, o agente Charlie Rakes é um sujeito que preza pela brutalidade como exercício do seu poder, mas em contrapartida, ainda que representante da lei, usa de um jogo muito mais sujo que o mítico gangster. Quando digo mítico, a afirmação parte da lenda local de que os Bondurant seriam invencíveis ou até mesmo imortais, reforçada pela quantidade de vezes que Forrest conseguiu escapar de uma morte certa. Tornando-se os únicos produtores “independentes” das imediações, sem dever e nem pagar propina a ninguém, passam a negociar com criminosos de primeira linha. Logo também começam a provar do conforto que o dinheiro advindo do lucro do negócio ilegal de bebidas pode proporcionar, especialmente o caçula Jack, um jovem admirador do estilo de vida de criminosos famosos da época, como o Floyd Banner interpretado pelo sempre eficiente Gary Oldman.

Apesar de Forrest ser um dos personagens mais interessante de Os Infratores, ele divide as atenções com seu irmão Jack, o verdadeiro protagonista do filme e também quem nos guia através da história. Acredito que a escolha da narrativa surgir pelos olhos do personagem mais romântico seja um acerto, pois assim o filme se despe da aspereza, se talvez tivéssemos a trama trazida por meio da visão crua de Forrest ou do irmão mais velho, o beberrão Howard (Jason Clarke, irreconhecível). Portanto, Os Infratores não deixa de ter seus momentos belos e poéticos, assim como os de A Estrada, muito apoiado pela mesma exuberante fotografia que valoriza com excelência as locações, característica que vem se mostrando cara ao cinema de John Hillcoat.   

O invejável elenco de Os Infratores, além dos já citados, ainda conta com duas presenças femininas muito importantes do atual cenário cinematográfico: a atriz revelação de 2011, a americana Jéssica Chastain e a australiana, não menos talentosa, Mia Wasikowska. Em um filme que preza por uma narrativa cativante, ainda que com plot points meio previsíveis, mas que não chegam a incomodar, talvez uma das minhas poucas reclamações seja sobre o sub-aproveitamento de ambas as atrizes. Jéssica Chastain se esforça, nos fazendo até compartilhar do caráter sofredor de sua personagem, a ex-dançarina e interesse romântico de Forrest, Maggie Beauford. No entanto, seu pouco tempo em cena não é o suficiente para aprofundar sua personagem e ela quase se torna uma alegoria dentro do filme. Infelizmente, não se pode dizer o mesmo da atuação de Mia Wasikowska. Com seu tempo mais reduzido que o de Chastain, o romance da sua Bertha Minnix, filha de um religioso local, com Jack é uma digressão que pouco acrescenta a trama, a não ser pelo conteúdo biográfico do desfecho.

Diferente do pouco aproveitado elenco feminino (será que é porque Os Infratores é um filme impregnado de testosterona?), a contraparte masculina entrega atuações consistentes, com Tom Hardy comprovando seu talento para viver personagens brutais (não foi assim em Guerreiro e Batman: Cavaleiro das Trevas Ressurge?) e Shia LaBeouf não comprometendo com seus costumeiros maneirismos interpretativos, como o excesso de expressões com as sobrancelhas, principalmente o arqueamento delas, conjugada com a sempre boca aberta. Aqui, o jovem ator entrega uma performance convincente, condizendo com a característica insegura, atrapalhada e desprovida de coragem do seu personagem. Ele ainda protagoniza uma das seqüências mais tensas do filme. Apesar de a família Bondurant ter o charme pertinente aos fora da lei do cinema, o destaque das interpretações fica por conta de Guy Pearce. O ator inglês entrega umas das suas melhores atuações dos últimos anos, construindo um personagem pedante, que gosta de se exibir, ora pela violência desmedida ora por intervenções não condizentes com seu cargo de agente especial. Não estranhem se Pearce aparecer como indicado em alguma premiação importante ao final da temporada.

Os Infratores é uma obra que mescla ação e dramaticidade com certa eficiência, também não deixando de ter suas pinceladas pessoais, ainda que contidas, de seu sólido realizador. No meu ponto de vista, não me incomodaria se o filme tivesse um pouco mais de tempo além dos seus 110 minutos, que convenhamos, é metragem um tanto tradicional para filmes atuais do seu porte. E esse condicionamento aos moldes comerciais é que acaba passando a sensação de que o longa-metragem é montado de uma maneira “redonda” demais, com sua narrativa indo logo aos pontos-chave e evitando digressões que fujam do mote principal: o confrontamento dos Bondurant com as “autoridades”. Em outras épocas, talvez pudéssemos esperar um pouco mais de ousadia ou pretensão, mas o resultado final de Os Infratores é bem satisfatório, entretendo com qualidade ao contar uma história “lugar-comum”, embora sempre bem-vinda no contexto cinematográfico.





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