Escrito em parceria com o
roteirista Roman Coppola, colaborador
também em Viagem a Darjeeling, Moonrise
Kingdom é apenas o sétimo longa-metragem da carreira do diretor
americano Wes Anderson. Embora seja uma
carreira até certo ponto curta, pode-se afirmar tranquilamente que o cineasta
pratica um cinema de viés autoral. Assim como o consagrado Woody Allen, os filmes de Wes
Anderson parecem se repetir, com seus personagens estranhos em situações
limites, enquadramentos semelhantes, porém, nem de longe são meros pastiches de
si mesmo, cada obra tem sua identidade própria e um frescor que sempre se
renova. Nessa sua nova realização, Anderson novamente toca em assuntos
recorrentes de sua filmografia, como problemas familiares, dificuldades de
relacionamento, carências afetivas, amor, vida e morte. No entanto, dessa vez,
o diretor nos apresenta suas caras temáticas pelos olhares ingênuos,
sonhadores, também maldosos e sinceros dos nossos protagonistas: dois
pré-adolescentes em franca descoberta de novos sentimentos e sensações.
A trama se passa no ano de 1965,
diga-se de passagem, um deleite visual ao encararmos a vistosa direção de arte
retrô. O local é a bucólica Ilha de Nova Penzance, no litoral da Nova
Inglaterra, conhecida também pelas violentas tempestades que costumam aplacar a
região em determinada época do ano. Em um curioso uso estilístico da narrativa,
o diretor, invés de apostar em uma simples narração em off para impulsionar os fatos, insere um narrador (Bob Balaban) como um personagem
aparentemente passivo. Este aparece para nos contar fatos históricos das
imediações e considerações distanciadas sobre os personagens. No entanto, em
uma manobra até ousada, surpreende o espectador agindo como um vigia de toda a
situação e interferindo em um ponto crucial da história. O mote principal de Moonrise
Kingdom enfoca Sam (Jared Gilman),
um incompreendido escoteiro órfão e Suzy (Kara
Hayward), uma jovenzinha talentosa, porém insegura. Motivados por um mútuo
amor juvenil, decidem sumir ilha adentro, refazendo assim um antigo caminho de
migração indígena e como conseqüência esperada, causando balburdia entre os
familiares da mocinha, os escoteiros e as autoridades que saem em busca de
ambos.
A jornada por dentro da ilha,
enfrentando terrenos acidentados, repletos de vegetação, rios caudulentos (que
rendem uma fotografia deslumbrante), ora o menino cozinhando para sua amada ora
ela lendo para ele as histórias de suas heroínas, ainda dormindo juntos na
apertada barraca e armando para fugirem de seus perseguidores, são situações
que geram um convívio simples, mas único. Nessa trajetória lúdica, de valor
inestimável, é que vão descobrir o sentido de suas vidas que acreditam serem
apenas vazias. Se a dupla de jovens protagonistas, com seus conflitos
pertinentes as suas idades, seria suficiente para cativar nossa atenção, Wes Anderson também não deixa de tratar
com carinho de seus coadjuvantes. Enriquecendo o filme, temos o chefe dos
escoteiros, Ward, vivido por um Edward
Norton em um perfeito personagem “wesandersiano”, o chefe de policia,
Capitão Sharp, interpretado por um Bruce
Willis comedido, mas sem deixar de ser emocional e os pais advogados de
Suzy, defendidos pelo ator fetiche de Anderson,
Bill Murray e a talentosa Frances McDormand. O filme ainda conta
com participações curtas, mas um tanto especiais de Harvey Keitel, Jason
Schwartzman e Tilda Swinton, como
a vilã que recebe a famigerada alcunha de “Serviço Social”.
Embora os atores adultos tenham
relevância nos momentos em que estão em cena, não sendo apenas meros adereços e
lembrando que crianças precisam de limites, como o Capitão Sharp cita em
determinado momento: “Mesmo crianças espertas colocam o dedo em tomadas”, a
obra de fato é do elenco juvenil. Além do já citado cativante trabalho do casal
protagonista, o longo time de atores que compõe a frota de escoteiros é um
pequeno achado, e no meu ponto de vista, renderia até um bem vindo spin off. Antes de finalizar, é mais do
que importante salientar com louvor a belíssima trilha sonora do compositor
francês Alexander Desplat. Uma
delicia para os ouvidos, a sua música original é crucial para compor a aura de
beleza singela das cenas, pontuando com delicadeza os momentos mais íntimos do
casalzinho. Verdade também que o trabalho de Jared Gilman e Kara Hayward
é de uma naturalidade impressionante. Ambos estreantes no cinema demonstram um
talento nato e guiados pela conhecida boa direção de atores de Anderson, entregam atuações convincentes
e carismáticas. A dupla protagoniza cenas, como a passada em uma minúscula praia
ou a do desfecho, lembrando os clássicos do cinema americano, que são pura
ternura. Talvez Moonrise Kingdom até não seja mesmo o melhor filme de Wes Anderson e nem o mais complexo, mas
sem dúvidas, é o mais encantador.
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