Crítica de Filme: 360 (Fernando Meirelles)

18 de agosto de 2012 6 Comente Aqui!

O novo trabalho internacional do diretor brasileiro Fernando Meirelles, “360”, desde que começou a ser exibido em festivais e afins vem ganhado duras críticas. Até concordo que o filme não seja um primor genial, tem suas imperfeições aqui e acolá, soando muitas vezes estranho, mas execrá-lo parece um grande exagero. Digo isso porque a narrativa da obra cativa, com algumas estéticas visuais elaboradas e fluindo facilmente na interação com o público. Não vejo um filme complicado, a representação é atual e mostra esse mundo globalizado em que vivemos, tratando do relacionamento entre pessoas cotidianas, ora pelo lado familiar ora pelo amoroso ou sexual e de como mesmo tendo uma jornada que possa nos levar o mais distante possível da nossa origem, muitas vezes é inevitável que não voltemos ao nosso ponto de partida, como em um movimento cíclico.  

Talvez o maior problema de “360” seja a dificuldade em trazer profundidade para tantos personagens interessantes, pelo menos isso é o que o espectador tende a esperar e pode acabar gerando algumas decepções. Por exemplo, temos o ator americano Ben Foster em uma atuação muito boa, mas o seu personagem, um maníaco sexual recém saído da cadeia, não tem mais do que alguns minutos em cena. Isso pode fazer soar rasteiro e incomodar, principalmente por um talento subaproveitado, mas acredito que essa tenha sido uma escolha concisa do diretor. O próprio Meirelles já afirmou se inspirar muito no trabalho do diretor americano Robert Altman (um papa nesse tipo de narrativa) e acredito que essa realmente tenha sido a grande influencia para “360”. E como influenciado por um consagrado diretor (que também teve seus altos e baixos), fica esse desafio: lidar com uma gama variada de personagens de uma maneira que faça a trama (ainda que parca) avançar.

Como um estudioso e influenciado por Altman, acho estranho que Fernando Meirelles tenha afirmado na abertura do Festival de Gramado que seu filme seja mais do roteirista Peter Morgan do que seu. Não deixa de ser uma afirmação contraditória já que notamos certos traços autorais recorrentes do trabalho do diretor brasileiro, em uma constante evolução desde Cidade de Deus, aonde se percebia traços de inspiração em Altman e até mesmo do italiano Antonioni: essa busca pelo que nos traz sempre para um reinicio. Não deixa de ser curioso e consideravelmente assustador para muitos essa translação, será que o ser humano nunca esta satisfeito com o seu presente? Ou será que nossa realidade ordinária sempre nos faz buscar um prazer momentâneo que nos faça parecer mais importantes?

Assim vemos os personagens de “360” progredirem em suas tramas, mas invariavelmente retornando ao ponto de partida de suas histórias pessoais: a busca por um amor, por prazer, aproximação familiar ou mesmo por uma vida dita “normal”. Em um primeiro momento vemos começar a digressão sobre um possível protagonista, mas logo a narrativa troca para outro e depois para outro. Em algumas cenas ela funciona perfeitamente, como no mote que envolve Anthony Hopkins, o já citado Ben Foster e Maria Flor, que rende uma das seqüências mais emocionais da trama, no entanto, em outros traslados, como o de Jude Law, a representação é distanciada demais e chega a entediar o espectador brevemente. A sensação é que em algumas das subtramas o diretor consegue fazer esse esquema funcionar direitinho, mas em outras, os desfechos parecem rasteiros, furtivos, para não dizer tolos e daí que vem essa minha afirmação sobre essa estranheza da obra.

O filme começa com uma cena de uma prostituta da República Checa, Mirka (Lucia Siposová) fazendo um ensaio fotográfico a fim de entrar no book de uma agência de acompanhantes de luxo. Logo me veio à mente “Blow-Up - Depois Daquele Beijo”, a meu ver, esse momento é uma clara homenagem ao já referido cinema de Michelangelo Antonioni. Esse vistoso prólogo é o inicio desse movimento cíclico narrativo proposto por Meirelles, fazendo a trama avançar através da França, Inglaterra, Alemanha, EUA e ainda envolver dois personagens brasileiros, Laura (Maria Flor) e Rui (Juliano Cazarré).

Como comecei a citar os aspectos técnicos, é importante ressaltar que “360” têm uma bela e bem elaborada fotografia de Adriano Volt e a trilha sonora supervisionada por Ciça Meirelles (esposa do diretor) é de bom gosto e traz o tom dramático e tenso quando solicitada. O elenco, além dos atores já nomeados, ainda é composto por outros bons interpretes como o ator alemão Moritz Bleibtreu, o francês Jamel Debbouze, a britânica Rachel Weisz entre outros menos conhecidos, mas não menos talentosos, como a atriz de origem Checa Gabriela Marcinkova (grata surpresa). “360” é pretensioso? É. Atinge com louvor sua proposta? Talvez atinja, mesmo com um problema aqui e outro ali. No entanto, não deixa de ser prazeroso presenciar o trabalho em escala mundial de um competente realizador brasileiro.




6 Comente Aqui! :

  • Anônimo disse...

    Achei importante sua crítica, acredito que foi gentil o suficiente pra ofuscar, talvez, que Fernando Meirelles, independente de curriculum, não teve notoriedade suficiente para rodar um bom filme, de fato 360°. Mas tenho que admitir a excelente trilha sonora. Igualmente, no início,lembrei de Blow-Up do meu queridíssimo Antonioni...

  • J. BRUNO disse...

    Ainda não vi o filme, mas pelo que já percebi o excesso de personagens e a superficialidade dramática que resulta dele são os maiores problemas do filme. Penso que se o elenco não fosse também composto por atores e atrizes já renomados o resultado talvez fosse melhor, isto porque credito à má recepção que o filme ao excesso de expectativa que foi criado em torno dele por causa dos nomes envolvidos...

  • Rodrigo Mendes disse...

    Não tenho o que discordar de você nesta ótima critica Celo. 3 6 0 tem momentos ótimos, a trilha selecionada pela Ciça é um charme e a edição do Rezende ajuda e muito o roteiro tão inspirador e pessoal do grande Peter Morgan. O filme tem seus momentos enfadonhos, mas nada que prejudique muito a sessão.

    Gostei da ideia da globalização e senti que o circulo se fechou como a proposta queria transpor ao expectador. Tem grandes atores em cena e concordo que Foster deveria ser mais explorado. Hopkins e Maria Flor dão um show! Meirelles é um dos poucos cineastas desta geração a se interessar por produções globalizadas.

    Abs.

 
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